Uma Carta
Esta carta foi escrita por uma criança de nove anos, aquando da morte duma criança nos braços de seu pai no conflito israel-palestiniano. Vale a pena partilhar e reflectir.
Adeus minha flor.
Vou partir, vou partir…sou forçado a abandonar-te, mas deixo-te algumas recordações de tudo o que vivemos juntos e que tu conservarás, assim o espero.
Vou contar-te um segredo ó minha flor: nunca consegui adaptar-me às pulsações descompassadas da vida. Nem compreendo o que está a acontecer agora, especialmente as pedras que passaram a fazer parte do nosso quotidiano.
Quando vamos para a escola, enchemos de pequenas pedras os bolsos das mochilas e as nossas mães, cuidadosas, perguntam-nos se já cumprimos essa obrigação, como se insistissem junto de nós para que não esquecêssemos o lanche.
Vivemos um tempo de correrias constantes. As aulas decorrem sob o medo, o terror, ao sabor das oportunidades. A própria imaginação está proibida, não acreditas? Pois é verdade, ó minha flor…
Sobrevivemos amargamente nesta espera, nesta esperança sempre adiada.
Ás vezes, lanço o meu avião de papel e fujo desta realidade, navegando por entre as nuvens que deslizam sob o azul do céu. Mas subitamente a televisão mostra as imagens do noticiário, um entrelaçar sucessivo de armas que disparam, de helicópteros que lançam bombas, sem que realmente saibamos o que se está a passar. E nós, as crianças, apertamos contra o peito as pedras da nossa «cultura» como se fossem armas automáticas. Então, o avião de papel regressa lentamente, soluçando, quando não acontece ficar preso nos fios das telecomunicações. É difícil entender a realidade que nos envolve…surpreendidas e perplexas quando as balas chovem sobre nós. A nossa vida desenrola-se na escuridão. Estão a roubar-nos tudo, ó minha flor…as flores que ainda não desabrocharam, os cânticos que ainda não foram entoados, as espigas louras da próxima primavera, as nossas esperanças…o nosso futuro…a nossa infância, ó minha flor.
Aqui, todos os dias tombam novos mártires, cujos corpos, envoltos em bandeiras, são levados aos ombros pelos seus irmãos. Há muito que se instalou a rotina da dor. Para nós, o dia começa com uma bala lançada de uma espingarda. É ela que nos desperta para a cruel indiferença que não cessa de nos rodear…
E o crime tornou-se parte do culto na capital da comunhão das culturas e das religiões.
Sim, minha flor, o crime…
Sim, em Jerusalém, na Terra Santa…
As crianças…
Quando os seus rostos ainda se assemelham a crisântemos, quando o seu sorriso encantador deveria permanentemente rasgar os seus lábios, encontramo-las a chorar, a escorrer sangue, com os seus corpos frágeis lançados na luta pela liberdade, numa luta para a morte…
Onde estão as expressões sonantes que dizem que nos devemos amar e abraçar uns aos outros, apesar de todas as diferenças e divergências?...
Infindáveis são os gritos que soltamos mas em vão, pois até agora não recebemos nenhum eco. Perderam-se todos no deserto da incompreensão e da indiferença, como se tivessem sido lançados num poço sem fundo…
Mas não podemos continuar de mãos atadas, minha flor…
Poderão eles persistir impunemente a roubar as flores que ainda não desabrocharam, a apagar os sóis que ainda não nasceram, a destruir os sorrisos?...
É-me difícil dizer-te adeus…
Mas sou forçado a abandonar-te, deixando-te algumas recordações de tudo o que vivemos juntos e que tu conservarás, assim o espero…
Adeus, minha vida.
Adeus, ó minha flor…
Vou partir, vou partir…sou forçado a abandonar-te, mas deixo-te algumas recordações de tudo o que vivemos juntos e que tu conservarás, assim o espero.
Vou contar-te um segredo ó minha flor: nunca consegui adaptar-me às pulsações descompassadas da vida. Nem compreendo o que está a acontecer agora, especialmente as pedras que passaram a fazer parte do nosso quotidiano.
Quando vamos para a escola, enchemos de pequenas pedras os bolsos das mochilas e as nossas mães, cuidadosas, perguntam-nos se já cumprimos essa obrigação, como se insistissem junto de nós para que não esquecêssemos o lanche.
Vivemos um tempo de correrias constantes. As aulas decorrem sob o medo, o terror, ao sabor das oportunidades. A própria imaginação está proibida, não acreditas? Pois é verdade, ó minha flor…
Sobrevivemos amargamente nesta espera, nesta esperança sempre adiada.
Ás vezes, lanço o meu avião de papel e fujo desta realidade, navegando por entre as nuvens que deslizam sob o azul do céu. Mas subitamente a televisão mostra as imagens do noticiário, um entrelaçar sucessivo de armas que disparam, de helicópteros que lançam bombas, sem que realmente saibamos o que se está a passar. E nós, as crianças, apertamos contra o peito as pedras da nossa «cultura» como se fossem armas automáticas. Então, o avião de papel regressa lentamente, soluçando, quando não acontece ficar preso nos fios das telecomunicações. É difícil entender a realidade que nos envolve…surpreendidas e perplexas quando as balas chovem sobre nós. A nossa vida desenrola-se na escuridão. Estão a roubar-nos tudo, ó minha flor…as flores que ainda não desabrocharam, os cânticos que ainda não foram entoados, as espigas louras da próxima primavera, as nossas esperanças…o nosso futuro…a nossa infância, ó minha flor.
Aqui, todos os dias tombam novos mártires, cujos corpos, envoltos em bandeiras, são levados aos ombros pelos seus irmãos. Há muito que se instalou a rotina da dor. Para nós, o dia começa com uma bala lançada de uma espingarda. É ela que nos desperta para a cruel indiferença que não cessa de nos rodear…
E o crime tornou-se parte do culto na capital da comunhão das culturas e das religiões.
Sim, minha flor, o crime…
Sim, em Jerusalém, na Terra Santa…
As crianças…
Quando os seus rostos ainda se assemelham a crisântemos, quando o seu sorriso encantador deveria permanentemente rasgar os seus lábios, encontramo-las a chorar, a escorrer sangue, com os seus corpos frágeis lançados na luta pela liberdade, numa luta para a morte…
Onde estão as expressões sonantes que dizem que nos devemos amar e abraçar uns aos outros, apesar de todas as diferenças e divergências?...
Infindáveis são os gritos que soltamos mas em vão, pois até agora não recebemos nenhum eco. Perderam-se todos no deserto da incompreensão e da indiferença, como se tivessem sido lançados num poço sem fundo…
Mas não podemos continuar de mãos atadas, minha flor…
Poderão eles persistir impunemente a roubar as flores que ainda não desabrocharam, a apagar os sóis que ainda não nasceram, a destruir os sorrisos?...
É-me difícil dizer-te adeus…
Mas sou forçado a abandonar-te, deixando-te algumas recordações de tudo o que vivemos juntos e que tu conservarás, assim o espero…
Adeus, minha vida.
Adeus, ó minha flor…
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home